
Tenho um rio nos meus olhos, que corre sempre sereno a caminho da foz dos meus pensamentos...
Os
meus passos imaginários, aventuraram-se no infinito do horizonte, e,
sem me dar conta, trouxeram-me a estas margens que gravei na lembrança
de um fim de tarde de Outono que nunca existiu...
Sentada neste chão
sem terra, desenho no meu caderno de folhas brancas, um esboço de um
poema sem letras, que me ofereceste sem te importares se o perceberia ou
não... onde a silhueta de um moliçeiro se ergue no leito quieto do meu
rio. Este mesmo rio onde um dia navegou a minha imaginação, sempre que
te avistava através das cortinas de cambraia cor de violeta, que
esvoaçavam ao sabor da brisa das tuas palavras quentes, que me chegavam
sob a forma de cartas sem remetente, enviadas de um tempo que se perdia
na lonjura dos dias sem fim.
Hoje regressaste desse tempo, mas já não
és o mesmo. A tua imagem envelheceu, os teus cabelos já tão ralos e
fracos embranqueceram e embora os teus olhos escuros e cavados me olhem
fixamente, não me vêem... há um vazio que preenche este espaço enorme
cheio de promessas e desejos do que nunca vivemos. E o tempo, sempre o
mesmo malvado tempo!... que um dia nos aproximou é o mesmo que nos
afasta, neste constante e ininterrupto martelar de tic tac's sem volta.