Pudesse eu voltar atrás
Por um instante que fosse...

Voltar àquela página
Que deixei em branco
E vasculhar os versos
Do poema que não te escrevi
Mas que
Mesmo assim
Te ofereci...

Nem percebeste
Que era poesia
O que ali estava
Bem à frente dos teus olhos
Ao alcance dos teus dedos
Mas tão longe do teu sentir...

E inconscientemente
Leste-o na minha pele
Com as palmas das tuas mãos
Como se o tivesse escrito em braille
Mas não o entendeste...

Pudesse eu voltar atrás
Parar o tempo
Por um instante que fosse...

E corrigir as rimas
Sem sentido
Desse estranho poema
Que me marcaram a alma
E me secaram a fonte dos afectos...





Passo a passo
Vou passeando a minha sombra
Pelas ruas desertas
Da cidade cansada...

Arrasto comigo
Os destroços de mais um dia
Que me suam o corpo
Empapando-me as roupas

Doem-me os olhos
Castigados pela força vã
De não quererem...

Do tanto que dei
Não sobrou nada
Nem um pingo...
Nada de nada!

A injustiça é um ácido forte
Corrói-me a alma!

Quis gritar
Mas não me deixaram...

Agora
Pesam-me as palavras
Que não me saíram da garganta

Sufocam-me...!




Não
Não morri...

Estou aqui
Do outro lado da tela

Não me vês
Não me ouves
Mas pressentes-me...

O silêncio
... estranha-me
O cansaço
... queda-me
A razão
... enlouquece-me!

Abandono-me
Nas entrelinhas dos dias
Que passam devagar...

Será este o meu destino?
Pesa-me tanto esta pena...

Esconder-me do mundo
No vale do esquecimento
Até que o silêncio
Me emudeça de vez

Mas não
Não morri ainda!

Estou aqui
Do outro lado da tela negra
Num sítio incerto
De lugar nenhum...

Já não me reconheço
Na ausência
De mim...